Se todo e qualquer show dos Titãs sempre foi aguardado com ansiedade, o que dizer daquele que aconteceria em Belo Horizonte, no dia 19 de novembro de 2005? Além de marcar o retorno de Lili e Ferdi a um show da banda — após um jejum de, inacreditáveis, dez meses — o show seria também o lançamento nacional do álbum mais recente, Titãs – MTV Ao Vivo.
A ansiedade era a mesa de sempre, já as confabulações não tão intensas como em outras ocasiões. Ferdi e Lili nem tiveram tempo de traçar uma estratégia para falar com a banda. Mesmo se vendo todos os dias e tendo sabido do show com antecedência, as duas se encontravam às voltas com o fim da faculdade e o excesso de trabalho. O quê Lili não esperava é que, em meio a tanto trabalho, um deles teria tudo a ver com o show que estava por vir. Parecia um dia de labuta normal, senão fosse por um detalhe: sua editora chefe havia lhe solicitado uma matéria sobre o show. Para isso, Lili deveria contatar o produtor da banda e entrevistar um dos músicos. O quê a editora não imaginava é que o produtor era o já conhecidíssimo por Lili, Fred, e os Titãs, nada menos que a banda do coração da jovem jornalista. Pauta na mão. Mas antes de começar o trabalho, um telefonema:
— Ferdi, adivinha quem eu vou entrevistar.
— Sei lá, Lili, quem?
— Também não sei. Mas é um deles.
— Um deles?
— Dos Titãs, Ferdi, peguei a pauta do show.
— Ai que tu-do!
— Tô tensa.
— Por que? Você faz pauta de show todo dia.
— Mas são eles, né?
— Ah, você já entrevistou o Britto uma vez. Vai ser tranqüilo.
— É, tomara que seja ele de novo.
— Tomara que seja o Charles...
— Ai, ai...
Hora da entrevista. Mãos suadas. Coração acelerado.
— Alô, Fred, aqui é a Liliane. Beleza?
— E aí Lili Beleza? Como é que você tá?
— Fred, hoje é sério. Eu estou ligando d’O Tempo. Preciso entrevistar um dos Titãs.
— Ok, qual deles?
— Não tenho preferência.
— Vou chamar.
Enquanto aguardava na linha, torcendo para que o Fred não revelasse que a Lili jornalista e a Lili fã eram a mesma pessoa, ouviu o produtor dizer: “Lili, de Belo Horizonte, aquela do cabelo vermelho”. Pronto, seus planos de camuflagem havia caído por terra, e ela estava ainda mais tensa. Tensão que durou até o momento em que Tony Bellotto atendeu ao telefone e foi só simpatia. A entrevista não poderia ter sido melhor.
Sábado. 19 de novembro de 2005. Dia em que a matéria foi publicada, como reportagem de capa, do caderno de cultura do jornal O Tempo. Dia também em que aconteceria o show. Mas nem naquele dia, Lili e Ferdi tiveram uma trégua. Passaram horas trancafiadas numa sala de diagramação, diante da tela de um iMac, diagramando uma revista. Entre uma página e outra, a lembrança: “É hoje”. No meio da tarde, decidiram seguir cada uma para sua casa, combinando de se encontrarem mais tarde no Chevrolet Hall, onde aconteceria a apresentação. Assim que se despediram, uma tempestade começou a desabar dos céus belorizontinos. O que elas não imaginaram é que aquele dilúvio duraria até os últimos acordes dos Titãs no show de logo mais.
Já eram quase 21h, quando Lili seguiu para o Chevrolet, acompanhada de Trópia, um fotógrafo do jornal que faria fotos para o arquivo. Do outro lado da cidade, Ferdi e sua irmã — que iria pela primeira vez a um show da banda — se preparavam para sair.
— Tá chovendo demais. Eu não vou deixar vocês saírem agora.
— Mas, mãe, essa chuva não vai passar. A gente tem que sair agora.
— Eu e seu pai vamos levar vocês. Assim eu fico menos preocupada.
Aproveitando a boa vontade dos pais, Fernanda decidiu, imaginando que mais uma vez seria inútil, convidá-los para o show:
— Por favor, pai. Entra. Assiste. Vocês vão gostar. Só assim vocês vão entender essa minha necessidade louca de ir a tantos shows deles.
Enquanto Ferdi usava todos os argumentos para convencer aos pais de assistiram àquela apresentação, o carro da família era quase invadido pelos cambistas mais afoitos. Até hoje Fernanda não tem certeza se seus pais cederam aos apelos dela ou dos cambistas. Mas cederam.
— Tudo bem, vamos. Mais dois ingressos, por favor.
Já dentro do Chevrolet Hall, os pais de Fernanda se instalaram na arquibancada, enquanto ela e sua irmã iam se encontrar com os amigos, Lili e João 100 Religião, claro, no gargarejo.
Hora de começar. “A melhor banda de todos os tempos da última semana”, dá início àquela que seria, como as fãs concluíram depois, umas das melhores apresentações dos Titãs a que elas já assistiram. Além das músicas clássicas e das inéditas gravadas no CD e DVD, a banda ainda presenteou o público com hits ausentes na gravação, como “Marvin” e “Go Back”.
O frio que fazia do lado de fora da casa de espetáculos, por conta da chuva torrencial que ainda teimava em cair, contrastava com o calor do público enlouquecido com a performance e sucessos titânicos.
Tony Bellotto parecia profético em uma news postada no titas.net, no dia anterior: “Chegou a hora, chova ou faça sol, estremeceremos a tradicional e a não tradicional família mineira! Escalaremos as alterosas, invadiremos por terra e por ar! As pedras que calçam as calçadas de Savassi jamais serão as mesmas! Não ficará pedra sabão sobre pedra sabão! Desfolharemos as couves! Azedaremos o doce de leite!”. E ele tinha razão. Pelo menos a mais ou menos tradicional família mineira de Fernanda se estremeceu. No melhor sentido da palavra. O pai, ainda durante o show, fez questão de ligar para alguns amigos e colocá-los para ouvir algum hit pelo celular. Nos dias seguintes não poupou elogios às performances de Charles e Branco, e à música que “eles compuseram para o Lula”. “Mas não é para o Lula, pai”, tentava explicar Ferdi, sobre “Vossa Excelência”. “Mas cada um interpreta a seu modo”, retrucava o pai, um anti-petista inveterado.
Ao final do espetáculo, Lili e Ferdi seguiram, cada uma para sua casa. Realizadas. Nem pareciam as mesmas enlouquecidas para falar com a banda a qualquer custo, que um dia foram. Na manhã seguinte, nada demais. Dormiram até mais tarde para descansar do estresse dos últimos dias. Tinham decidido: nada de ir atrás dos Titãs, precisamos dormir.
Por volta do meio-dia, Fernanda se levantou e foi checar seus e-mails. Encontrou-se com Sam no MSN e descreveu para a amiga o show da noite anterior. Empolgada com os relatos de Ferdi, Sam lamentou a ausência da banda por terras cearenses e incentivou a amiga a ir falar com eles: “Ferdi, tem que aproveitar a oportunidade. Veja meu caso, eles sumiram daqui”. Era só de um empurrãozinho desses que Ferdi precisava. Ligou para Lili e em uma hora estavam as duas no já tradicional Hotel Mercure. Foi por pouco. Quando entraram no saguão se encontraram com a banda inteira, que se preparava para sair. Foi o tempo suficiente para uma conversinha rápida, fotos e, claro, para matar as saudades. Estava aberta mais uma turnê. E o começo de tudo outra vez.
“Tempestades vão cair, edifícios vão ruir” — Anjo Exterminador (Titãs, MTV Ao Vivo — 2005)
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